Segure a respiração até que tudo seja revelado.
A Obra
Gyo (ギョ,”Peixe”), cujo título completo é Gyo Ugomeku Bukimi (ギョ うごめく不気味, literalmente “Peixe: Estrebuchando de medo), é um mangá de horror voltado para o público adulto, escrito e ilustrado por Junji Ito, que foi publicado pela primeira vez na Big Comic Spirits de 2001 a 2002.
A edição da Devir trará, pelo selo Tsuru, a história completa em um único volume, incluindo também duas histórias bônus, A Trágica História do Pilar Principal e O Mistério da Falha de Amigara.
Ito declarou em uma entrevista que Gyo definitivamente foi inspirado em Tubarão de Steven Spielberg: “Ele capturou magistralmente a essência do medo na forma de um tubarão devorador de homens. Eu achei que ficaria ainda melhor registrar esse temor num tubarão devorador de homens que circula tanto na terra quanto na água”. Na mesma entrevista, ele disse que dois de seus filmes favoritos são O Exorcista e Operação Dragão, além de gostar muito de filmes de horror, claro, e dos trabalhos de Wills O’Brien, Ray Harryhausen, Hitchcock, Spielberg e Chaplin.
Em 2007, Gyo foi incluída na Seleção Oficial do Festival Internacional de Quadrinhos de Angoulême. Em 2012, foi lançada uma animação original em vídeo de uma hora de duração baseada nesse mangá, dirigida por Takayuki Hirao. Guillermo Del Toro (diretor de O Labirinto do Fauno, Círculo de Fogo) já declarou ser fã de Ito. Segundo ele, uma das sequências de Gyo foi a única virada de página que o fez literalmente pular de susto da cadeira. (Os dois quase trabalharam juntos em um game da franquia Silent Hill, mas o projeto foi cancelado).
Gyo é uma história de monstros meio máquina, meio peixe que invadem o Japão, espalhando um fedor medonho e contagioso. Tadashi e sua namorada Kaori tentam sobreviver à invasão dos peixes que andam e, também, descobrir o motivo do ataque. Sim, você leu certo: peixes que andam! E se você conhece o trabalho de Junji Ito, já sabe o que esperar: uma história surreal de horror!
Os personagens de Gyo são envolventes e plausíveis, jovens sensatos e racionais que se veem envolvidos em circunstâncias extremas. Aliás, a história se concentra nas situações desesperadoras e nas mudanças físicas e psicológicas dos dois protagonistas da trama. As imagens são bem fortes, com algumas das melhores descrições de horror já feitas pelo autor, em que a fauna marinha mutante é extremamente fiel e os designs das criaturas mecânicas são retratados de maneira perfeita. Ah, e além das tantas criaturas estranhas que aparecem neste mangá, o autor usa outros sentidos para deixar tudo ainda mais verosímil, no caso, o olfato, descrevendo um odor forte enjoativo para intensificar a atmosfera de horror.
Certa vez, quando perguntado sobre o que o inspirava a escrever histórias de horror, Ito respondeu: “Eu busco inspiração em várias situações da minha vida cotidiana. Eu vejo as coisas de ângulos diferentes e frequentemente tenho ideias interessantes desse jeito. Basicamente, eu me inspiro em filmes e quadrinhos de horror e histórias de mistério. Cenas e sons naturais, como o alvorecer e tempestades também estimulam minha criatividade. Tenho interesse também em documentários sobre antigos samurais, e no ofício dos titeriteiros. Civilizações e culturas esquecidas também são uma grande fonte de inspiração.”
Nas palavras de Aki Itami, roteirista da adaptação de Uzumaki para o longa de animação: “O legal de Ito é seu timing de ritmo e velocidade. Tem muita informação, o que é bem desafiador num roteiro. Na minha opinião, o que mais importa depois do medo é a beleza […] O universo do sr. Ito é muito terrível e muito belo.”
O Autor
Junji Ito é capaz de transformar tudo e todos em personagens assustadores… sejam eles peixes, espirais ou lindas jovens. Nascido no dia 31 de julho de 1963 no distrito de Gifu, no Japão, seu interesse por quadrinhos começou no colégio quando sua irmã mais velha lhe emprestou um gibi de horror do mangaká Kazuo Umezu, que se tornaria uma grande influência nos seus trabalhos – tanto que, em 2014, ele escreveu o mangá autobiográfico Umezu Sensei and Me, sobre sua veneração infantil em relação ao trabalho de Umezu.
Ito, então, decidiu adotar os quadrinhos como um hobby ao se entusiasmar por essa forma única de narrativa e pelos desenhos de sua irmã. Ele começou a escrever e a desenhar bem cedo, inspirado por autores como o supracitado Kazuo Umezu, Hideshi Hino e o autor norte-americano H.P. Lovecraft. A partir daí, Ito tornou-se um dos mais conhecidos e influentes autores de mangá do Japão.
Durante alguns anos, na década de 80, ele exerceu a profissão de protético dentário, acreditem se quiser, até desistir dessa carreira – coisa da qual nunca se arrependeu – para se concentrar totalmente nos quadrinhos, trocando os horrores da vida real de um dentista pelo horror da ficção.
Na década de 1990, Ito publicou diversos trabalhos na Nemuki’s e na Bizarre Tales of Sleepless Nights. Em 1997, ele publicou uma minissérie em quatro partes chamada The Tragic Story of the Giant Black Pillar na Big Comic Spirits Weekly da editora Shougakukan. Em 1998, tornou-se um colaborador frequente da Big Comic Spirits Weekly, publicando sua famosa série Uzumaki. Em 2001, Ito criou mais uma série de horror para a Big Comic Spirits intitulada… Gyo. Outras de suas obras conhecidas são The Human Chair, The Thing That Drifted Ashore, The Hanging Balloons, Whispering Woman, The Enigma of Amiagara Fault, Fragmentos do Horror.
Vários de seus trabalhos foram adaptados para o cinema ou televisão, como Tomie, Senritsu no senritsu (The Fearsome Melody, 1992), Nagai yume (Long Dream, 2000), Kakashi (Scarecrow, 2001), entre outros. Em 2019, ele recebeu um Prêmio Eisner por sua adaptação em mangá de Frankenstein de Mary Shelley. Nas palavras do crítico de cinema, Bob Chipman, “quadrinhos são bizarros”, e os mangás de Jinjo Ito são a prova disso. Aliás, a arte fantástica do autor confirma o que muitas pessoas já suspeitavam: se quisermos uma legítima história de horror, precisamos de um ex-dentista para criá-la, afinal, Ito é certeiro ao utilizar toda a bizarrice das suas ideias e desenhos para deixar o leitor chocado, em trabalhos que geralmente se concentram em aplicar conceitos de horror cósmico à vida cotidiana e apresentam personagens afetadas ou transformadas por forças além de sua compreensão.
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